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sábado, 8 de dezembro de 2012

RECORDAR É VIVER! Por Petrônio Sabrinho - Caso I - Gilberto Quadros


                                      
Caso I

 O “Pioneiro” da Comunicação Via Satélite

No qüinqüênio final da década dos anos 70 (século XX), a BR-163, depois do posto do Gil, era apenas um longo risco vermelho sangrando o cerrado e a mata amazônica de transição, facilitando e incentivado o povoamento controlado ou fora dos propósitos do poder estatal de um imenso vazio demográfico, até pouco atrás um éden verde habitado pelas etnias Kayabi, ao longo do rio Teles Pires, e Panarás (então chamados Krenakarôre ou “índios gigantes”) na região dos rios Peixoto de Azevedo e Braço Sul e nas fraldas da majestosa serra do Cachimbo, na divisa com o sul do Pará.
Muitos se lembram, o lema governamental com relação à Amazônia era: “integrar para não entregar”. E isso, em Mato Grosso, recém dividido, foi seguido à risca com a construção de três grandes rodovias federais como eixos de penetração: as Br’s-163, 364 e 158, todas basicamente cruzando o Estado em sentido sul-norte.
Deixando Mato Grosso, a BR-163 avançava – e ainda avança - em direção ao território paraense para alcançar a cidade de Santarém. Assim, “terras devolutas”, até então ocupadas por índios, escassos seringueiros e aventureiros em busca de ouro e diamante passaram, de repente, à cobiça empresarial e do próprio governo federal para o início de um vertiginoso processo de colonização privado e oficial, totalmente incontrolável sob a ótica ambiental.
Em menos de uma década, inúmeros projetos de colonização e assentamentos foram implantados e extensas áreas de vegetação quase que intocáveis vieram abaixo. Hoje, boa parte desses núcleos pioneiros do eixo da BR-163 forma um conjunto de municípios sediados por importantes cidades, como: Sinop, Sorriso, Nova Mutum, Lucas do Rio Verde, Colíder, Santa Carmem, Vera, Cláudia, Nova Canaã do Norte, Peixoto de Azevedo, Nova Santa Helena, Matupá, Guarantã do Norte, Nova Guarita e Terra Nova do Norte (a minha preferida), atualmente reconhecidas expressões nacionais no amplo contexto do agronegócio.
Lá em cima, mais de 750 km de Cuiabá, na fronteira com o Pará, existia um projeto privado, em fase inicial de implantação, comandado pela COTREL (Cooperativa Tritícola Erechim Ltda, do Rio Grande do Sul). Em área contígua, à margem da rodovia, o INCRA, por determinação superior, também teve que assentar “colonos brasiguaios”, expulsos do Paraguai, em meados dos anos 80, no projeto denominado CIRA-Braço Sul. Os dois deram origem aos atuais municípios de Guarantã do Norte e Novo Mundo. À época, a região era inóspita e temido reduto endêmico de malária.
No setor estatal da agricultura, além do INCRA, a CFP (Companhia de Financiamento da Produção, dos  velhos e bons tempos) foi chamada a compor a linha de frente nesse processo de ocupação e dar a sua inestimável contribuição ao processo de comercialização, amparando os produtores na aquisição direta da produção gerada, naqueles tempos praticamente só arroz, com classificação simplificada (operação POVOC).
As equipes de campo da CFP eram formadas, em comum acordo, entre a Sede, em Brasília, e a Agência Regional no Estado (AGMAT). Cada equipe tinha uma localidade de referência e, informalmente, a “chefia” de um coordenador microrregional. Este, entre outras obrigações, tinha a responsabilidade de percorrer as demais localidades produtoras do entorno, nem sempre próximas das “sedes de vanguarda”, avaliando a safra, coletando os dados das compras, necessidades de sacaria, acompanhamento da execução dos serviços de classificação e armazenamento, bem frágeis e insuficientes, dar notícias do mundo civilizado e dos familiares aos colegas de campo, estimando, inclusive, o prazo máximo para a retirada da produção adquirida. As informações eram repassadas para a coordenação estadual e dependendo da região diretamente para Brasília. As estradas vicinais, invariavelmente, eram sofríveis, exigindo cautela, coragem e muito sacrifício para serem percorridas.
No nortão, trecho terminal da BR-163, a base das operações ficava em Colíder, uma pequena e movimentada vila, por dispor de “maiores recursos infraestruturais”. O “acampamento”, em geral, acontecia em moradia cedida pelo INCRA junto com o seu pessoal de unidade avançada; empresa colonizadora, cooperativa, e em pequenas pensões, quando havia. Era difícil, mas muito poucos reclamavam dessa precária situação.
O Gilberto Quadros - não sei porque razão - gostava, em demasia, de operar na base estabelecida em Colíder, onde era muito querido, decorrente de sua facilidade de fazer amizade, brincar e prestar colaboração e solidariedade a todos. Dotado de espírito aventureiro, e, desde então, “andador” que só lobete de mão pelada, apreciava percorrer os demais postos de compras. Quase sempre levava à tira colo o seu PX – estação fantasma, que utilizava quando a energia elétrica gerada a partir de motor movido a óleo diesel assim permitia, ou seja, em pouquíssimas horas durante o dia. Á noite, logo depois das 08h00, a escuridão voltava a reinar, já que a fonte geradora saía do ar. Aí imperavam o lampião, as lamparinas, velas e as lanternas.
Apesar de suas passadas, quase sempre prolongadas – também não sei porque – pela COTREL e CIRA-Braço Sul, as informações teimavam em não chegar, tempestivamente, em Cuiabá. Quando questionado a respeito, argumentava que tal fato não correspondia à verdade, pois os dados vinham sendo encaminhados, sistematicamente, via satélite.
Certo dia, não entendendo a razão dos atrasos e da inconsequente resposta, pensei com meus botões: “esse cara está me gozando”. No contato seguinte, fui logo interpelando: “que história (ou estória) é essa de mandar os dados por satélite. Você deve estar maluco ou tomando cerveja quente demais além do limite ou está enrolando. Assim não dá, meu!”. A resposta foi curta e objetiva. Aguarde e verá! E a conversa foi logo encerrada.
Decorrido pouco tempo recebi um recado dizendo para ir, ou mandar alguém, num determinado endereço para apanhar algumas correspondências vindas de Colíder. Sabia, de antemão, que eram informações das operações na região. Entre elas constatei estarem as de COTREL e CIRA-Braço Sul. E o Giba Quadros estava certo e realmente me gozando. De fato, as informações haviam chegado via satélite, não posso negar. No endereço, funcionava uma pequena empresa de ônibus, hoje uma grande no ramo, cujo nome era – e ainda é - Viação Satélite. Só mesmo o velho e estimado Giba para aprontar uma dessas!

                                Petrônio Sobrinho

(Eternamente grato aos colegas da ex-CFP que viveram a aventura de desbravar a fronteira agrícola mato-grossense nos anos 80 – hoje o marco maior do agronegócio brasileiro que o mundo todo reverencia).


  

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